16 de mai. de 2016

INCOMPARÁVEL


Cauby Peixoto; MPB; Conceição;
Foto: Paulo Pinto/Fotos Públicas (15/05/2016)

Uma pneumonia calou ontem (15/05) para sempre a voz viva e marcante de Cauby Peixoto, ícone e mito musical brasileiro que emocionou gerações por mais de 66 anos, ao longo de 45 álbuns gravados.

Ídolo de um público fiel, Cauby também foi fiel aos seus fãs como se deve ser nos relacionamentos sinceros e duradouros. 

Por mais de seis décadas seus seguidores lotaram as casas de espetáculo onde Cauby se apresentava emocionando multidões de mulheres e homens.

Apesar do reconhecimento e da adoração apaixonada dos fãs, Cauby Peixoto não deixou o sucesso lhe subir à cabeça e manteve-se sempre próximo ao seu público, embora na vida intima fosse bastante reservado.

Filho caçula, Cauby tinha a música no sangue (o pai era professor de violão e mãe tocava violino) e a brasilidade Tupy-guarani no nome. Pertencia a uma família em que a maioria dos irmãos tinha nome indígena. Cauby é uma variação de Caiubi e significa Folhas azuis.

Fluminense de Niterói, há anos escolheu São Paulo como sua morada e foi devidamente aceito por ela. A partir de Sampa fortaleceu e expandiu sua bem sucedida carreira, chegando a lugares distantes do país.

Cauby possuía longevidade na vida e na arte. Do coro da igreja em Niterói aos palcos do mundo, sua voz também alcançou corações além-mar. 

Tentou carreira internacional cheia de idas e vindas e com relativo sucesso, usando como nomes artíticos Ron Coby e Coby Dijon, mas não atingiu o mesmo reconhecimento que conseguiu no Brasil.

Foto: Reprodução
A voz não era o único dom considerado inigualável (comparada somente com a de Frank Sinatra, um dos seus ídolos). Seu estilo e jeito de se vestir também eram sob medida, senão personalizados.

As roupas brilhosas e as perucas chamavam atenção, mas não tiravam o brilho daquele que tinha luz própria.

Fazia questão de ser educado e tratar, quem era ou não seu fã, sem rancor ou distinção, mesmo quando tinha sua orientação sexual posta em dúvida. 

Questionado se era ou não gay, nem confirmava nem negava, simplesmente continuava sendo quem era: Cauby.

A música era seu eterno amor, tanto que certa vez afirmou: “Prefiro cantar do que amar. Casei com a carreira. Sou autossuficiente e me basto”.

Músicas que eram aparentemente bregas ou de gosto duvidoso transformavam-se em canções românticas na interpretação de Cauby. 

Ele cantou do rock (foi o primeiro a gravar uma canção de Rock em português, em 1957) ao Samba-canção com propriedade, mas sempre sem abrir mão do bom gosto nem se render às batidas sensuais ou às letras meladas só para ficar em evidência.

Cauby não era apenas um cantor ou só mais um cantor. Era tradutor do amor e interprete dos corações. 

Sou voz límpida e tecnicamente bem colocada, juntamente com seu estilo incomparável, vão continuar a encantar muitos e permanecerão, como ele, para sempre inigualáveis.

RIP, Cauby! 

12 de mai. de 2016

NOVA VELHA HISTÓRIA


Golpe; Dilma; PT; Corrupção; Brasil; Lava Jato; Lula; Temer
Foto: Roberto Struckert/Instituto Lula (12/05/2016) Fotos Públicas

O afastamento da presidente Dilma Rousseff foi o passo mais ousado da oposição em direção à retomada do comando do país, mas não o último.

A condenação do Partido dos Trabalhadores ao ostracismo e ao exílio político deverá ser a cartada final ou a pá de cal que ainda falta aos opositores na luta pelo poder.

O impeachment fabricado por PSDB, DEM, Eduardo Cunha e demais correligionários e partidos aliados foi a demonstração mais clara da falta de respeito com a democracia e com a eleição direta para presidente do Brasil.

Se o voto antes era apenas uma escada para se chegar ao Palácio do Planalto e estava condicionado aos interesses mesquinhos da maioria dos políticos profissionais do nosso país, hoje foi rebaixado a instrumento figurativo.

Os agora governistas não estão nem aí para os mais de 51% dos votos que elegeram Dilma Rousseff, e seguem em frente na sanha de mudar o sistema político brasileiro em favor deles, de seus interesses e dos interesses das elites brasileiras.

A verdade é que os ardilosos não têm projeto político para país, mas projeto de poder.

A próxima investida é enfraquecer ainda mais o direito de escolha do povo, exercido através do voto, instaurando o parlamentarismo ou o poder do legislativo, concentrando-o na figura do Primeiro-Ministro e atribuindo às outras instâncias democráticas ações meramente decorativas.

No parlamentarismo, a Constituição muitas vezes é mera peça ornamentaria que pode ser alterada de acordo com os humores e as vontades do parlamento, vide Inglaterra, onde sequer há constituição escrita.

O golpe foi o primeiro passo para se eliminar a Constituição, ironicamente, considerando as atuais circunstâncias, chamada de Cidadã e promulgada por muitos que hoje fazem questão de aviltá-la.

A aprovação do afastamento de Dilma Rousseff foi uma condenação política e não um ato de respeito à Carta Magna que rege o país. 


Afastar a presidente porque não cumpriu o que prometeu é no mínimo contraditório quando a maioria dos políticos não passam de mentirosos graduados e contraventores descarados.

Se pedalada fiscal é crime de responsabilidade e justifica o impedimento, vamos derrubar também os 16 governadores que há anos cometem o mesmo "delito"? Duvido.

No país em que grande parte da população é teleguiada pelas informações viciadas da imprensa hegemônica que visa apenas o lucro, impeachment e crime de responsabilidade soam como palavrão nos ouvidos da galera. Expressões demagógicas na boca de oradores oportunistas.

Dois deles são a expressão máxima e representativa do fisiologismo e da democracia de fachada pregada pelos lobos do covil chamado Congresso Nacional: Gilberto Kassab e Marta Suplicy.

Kassab, poucos dias antes votação da admissibilidade do impeachment pela Câmara dos deputados, era ministro do mesmo governo que ajudou a derrubar em nome da pátria, da família, da propriedade, ética e do combate à corrupção. Hoje é ministro de Temer. Belo exemplo da meritocracia tucana.

Marta, até pouco tempo era defensora voraz de um partido que jurou fidelidade, mas que disse ter saído porque foi tomado pela corrupção. Esquece-se, entretanto, que o partido em que está atualmente possui políticos sob suspeita e investigados pela Lava Jato. 

O partido que a senhora está atualmente é tomado por que e por quem, nobre senadora? De certo, por pessoas justas e honestas como a nobre senadora.

Vocês envergonham a política, no sentido mais denotativo e mais amplo que ela possui. Não valem o voto que receberam. Falam demais por não ter nada a dizer.

O pior é que vossas excelências ainda ajoelham e rezam.

Cuidado, senhores! Como diz a canção de um antigo compositor baiano, a vida é real e de viés.

Enquanto Dilma sai do poder pela porta lateral, o PSDB, por enquanto, volta ao poder (ou o toma) pela porta dos fundos. 

Vossas senhorias podem até acreditar, mas a história não é uma lata de lixo. Ela saberá colocar cada um dos senhores em seu devido lugar.

4 de mai. de 2016

VIA CRUCIS


Dilma; Lula; Golpe; Temer: Lava Jato; Corrupção; Brasil; Política
Foto: Lula Marques/Agência PT (17/03/2016) Fotos Públicas

A decisão tomada ontem (03/05) pela Procuradoria Geral da República deixou o inferno astral da presidente Dilma Rousseff e o martírio do ex-presidente Lula longe de terem um final feliz. Na verdade, o calvário de Dilma e Lula só está começando. 

A via crucis deles e do PT passará pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e o tiro de misericórdia poderá ser dado em Curitiba pelas mãos do juiz Sergio Moro e pelos eleitores no pleito de 2016.

A retirada de Dilma do poder, ao que tudo indica, não é suficiente. É preciso inviabilizar também, se não politicamente, pelo menos jurídica e moralmente, a candidatura de Lula em 2018. 

A capacidade do ex-presidente de superar desafios e a facilidade em sair direta ou indiretamente vitorioso dos embates que campeia, sempre foi uma ameaça constante para os seus inimigos.

As justificativas do procurador-geral Rodrigo Janot para pedir a abertura de inquérito da dupla petista e do advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, por suspeita de obstrução da Lava Jato, foram recebidas como fortes e contundentes pela classe política, tanto que deixaram Lula deprimido e chateado, segundo informações da jornalista Mônica Bergamo.

Ao promover a abertura do inquérito Janot pôs na boca da oposição e nas mãos de alguns setores da imprensa os argumentos que queriam, queimando um pouco mais a imagem do ex-presidente e tornando remota a possibilidade dele entrar na disputa de 2018.

Se Lula demonstrava estar um tanto quanto fragilizado e seu futuro político incerto, sua provável candidatura fragmentou-se e deixou a imagem do PT mais pulverizada. 

Mas, antes mesmo do grande teste nas urnas em 2018, o partido terá de enfrentar sua primeira provação pública nas eleições de 2016.  Por enquanto, as perspectivas não estão tranquilas nem favoráveis. Baixas também já começaram a acontecer. 

Preocupados em não terem sua reputação atrelada à imagem de um partido que é acusado de profissionalizar a corrupção no Brasil, 11% dos prefeitos eleitos em 2012 abandonaram recentemente a legenda, segundo reportagem da Folha de S. Paulo.

Enquanto o destino dos líderes petistas estará nas mãos do Supremo Tribunal Federal, o futuro do partido dependerá mais do que nunca do voto dos eleitores. 

Entretanto, o atual horizonte eleitoral acinzentado em que o PT se encontra tende a tornar mais difícil a possibilidade do Partido dos Trabalhadores volta a voar em um céu de brigadeiro. 

Se na justiça divina as coisas acontecem no tempo determinado por Deus, na justiça brasileira as decisões políticas e judiciais acontecem no tempo determinado por Janot, Zavascki, Moro e companhia limitada. 

Se depender deles, o destino se confirmará implacável e a Fênix petista dificilmente ressurgirá tão cedo.


27 de abr. de 2016

PRESIDENTE BIBELÔ


Foto: Antônio Cruz/Agência Brasil (28/04/2015) Fotos Públicas

As exigências feitas pelo PSDB para apoiar um possível governo Temer são no mínimo indecentes. Mais do que tornar o talvez provável futuro presidente do Brasil em um refém de seus interesses presidenciais maniqueístas, os tucanos querem promover Temer de vice-presidente de fachada para presidente bibelô, o legítimo vaquinha de presépio.

A sanha peessedebista em voltar à presidência do país de forma indireta já se tornou obsessão.

De duas, uma: ou os tucanos querem ferrar o vice-presidente, inviabilizando seu provável mandato presidencial antes mesmo dele acontecer, ou querem ser dispensados por Temer, invés do próprio PSDB se dispensar por si só de um provável governo peemedebista. De uma forma ou de outra, o tucanato dá sinais claros que quer vencer Temer pelo cansaço.

De negociata em negociata, o Brasil vai se notabilizando como uma República de golpistas.

Ao exigir que Michel Temer não concorra à reeleição em 2018 e impedir que o PMDB lance candidatos próprios nas principais cidades do país nas eleições a prefeito desse ano e na dos governos estaduais daqui há dois anos, os tucanos querem algo inédito: fazer com que um partido se torne primeiro-ministro, quando o natural é que um político o seja. 

Agindo assim, FHC, Aécio e companhia ilimitada governariam indiretamente o país e anulariam as possíveis ações temerescas revanchistas e traiçoeiras. O PSDB conhece bem sua presa, sabe que Michel de anjo só tem o nome e que apesar disso não é nada confiável.

Foto: ASCOM/VPR (25/04/2016) Fotos Públicas

A propósito, as ideias de Temer não se realizam na pessoa do vice-presidente do país, muito pelo contrário, são inviabilizadas pelo comportamento e pelas atitudes questionáveis do atual presidente licenciado do PMDB.

Entre quiproquós e trocadilhos, enquanto os pares não se entendem, pesquisa realizada pelo Instituto Ibope Inteligência apontou que somente 14% dos brasileiros de dizem satisfeitos com a democracia, 34% dizem estar poucos satisfeitos e 49% nada satisfeitos.

A desilusão da população com o atual quadro político não para por aí. Só 40% afirmaram que a democracia é preferível a qualquer outra forma de governo, e o que é pior, para 34% dá na mesma se um regime é democrático ou não.

Situação preocupante, já que, de acordo com o estudo, o brasileiro demonstra que pouco se importa com a possibilidade da existência de um regime autoritário.

Nessa briga entre mocinhos e bandidos não vai ser difícil separar o joio do trigo, posto que, nesse balaio que a política nacional se tornou, há excesso de joio e escassez de trigo.

De qualquer forma, acordos entre PSDB e PMDB devem ser registrados em cartório e com firma reconhecida, afinal de contas, vai que...

20 de abr. de 2016

ENTRE O CÉU E O INFERNO


Foto: Antônio Cruz/Agência Brasil (26/06/2015) Fotos Públicas

Foto: Lula Marques/Agência PT (18/08/2015) Fotos Públicas

O Senado nem sequer acatou formalmente o processo de impedimento da presidente e os futuros apoiadores do provável governo Temer já começam a dar sinais de desentendimento entre si, confirmando que o apoio ao impeachment será a moeda de troca utilizada para o pagamento dos mais de 300 votos contrários à permanência de Dilma no comando do país.

Sim, a fatura chegou mais rápido do que se esperava.

Temer já articula nomes para seu mandato presidencial como se já tivesse sido empossado. Entre recusas e aceitações publicamente não declaradas, o ainda vice-presidente vai efetivando sua chegada ao poder.

A estratégia é escolher nomes que impactem e conquistem a população e agradem o mercado.

Medidas muito ousadas não serão adotadas de início, mas, a julgar pelas propostas contidas no plano de governo divulgadas há meses sob o nome de “Uma ponte para o futuro”, políticas neoliberais serão o destaque e a tônica inevitável do provável futuro presidente do Brasil.

Nesse jogo de cartas marcadas, a guerra de afirmações também já foi declarada, tanto é que a imprensa, em informações oficiosas, já divulga que Temer não pretende acabar com os programas sociais, bandeira vitoriosa da administração petista, mas em atualizar esses programas. O risco é saber qual é o significado de atualizar no dicionário temeresco.

Longe de ser uma unanimidade entre a população, o apoio declarado ao muito provável governo Temer também não está consumado ou garantido por parte de alguns partidos até então alinhados com o vice-presidente em relação a aprovação do impeachment.

É o caso do PSDB que, como sempre, nunca está totalmente afinando nem interna nem externamente entre si.

Enquanto há alguns nomes do partido apoiam que embarque total no barco de Temer, outros são contrários e acreditam que o PSDB estaria entrando em uma canoa furada e defendem um apoio seletivo ao governo do peemedebista, como é o caso do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin.

Alckmin não está preocupado com o partido, mas com suas intenções políticas para 2018 ou mais precisamente com a possibilidade do também sempre presidenciável José Serra se tornar ministro de Temer. 

Se Serra aceita e se dá bem, pode levar a melhor na disputa com Aécio e o próprio Alckmin pela indicação do partido como concorrente a presidência nas próximas eleições.

De uma forma ou de outra, o PSDB está em um mato sem cachorro e diante de um dilema político: se apoia Temer e o governo dele emplaca, com que argumentos e moral poderá se contrapor à uma possível, e muito provável, candidatura de Temer à reeleição em 2018?

Se fica de fora e o governo Temer emplaca, quais os argumentos que usará para atacar um governo que deu certo? 

Se aceita e o governo Temer for mal, com que moral poderá criticar ou atacar um governo do qual fez parte e ajudou a colocar no poder? 

Pelo que tudo indica, Temer e o PSDB podem se tornar o céu ou o inferno um do outro. Sem direito a purgatório.

14 de abr. de 2016

CIDADE NEGRA

Haitianos ocupam a cidade, submetem-se ao trabalho informal como mão de obra barata e se tornam a cara da nova onda migratória em São Paulo

Foto: Cido Marques/FCC (18/05/2014) Fotos Públicas

A avenida São João, localizada centro de São Paulo, é um dos cartões postais mais famosos da cidade. No início do século XX era conhecida por sua constante agitação cultural e por abrigar, além de cinemas, teatros e lojas especializadas no comércio de calçados e guarda-chuvas, um grande número de migrantes e de imigrantes. Já foi cantada em verso e prosa por poetas e músicos, como o cantor Caetano Veloso que a imortalizou em Sampa, considerado por alguns um hino à cidade.

Nos últimos dois anos, entretanto, quem passa ao longo da São João percebe que é outro movimento e outros sons, ou mais precisamente, outros sotaques que têm ocupado a avenida e ecoado nas lojas, bares, hotéis e ruas ao redor: Os imigrantes haitianos são os novos habitantes do pedaço.

Segundo dados oficiais. dos 1,7 milhão de estrangeiros de 85 nacionalidades que vieram para o Brasil desde 2011, pelos menos 600 mil vivem na capital paulista e os haitianos são o exemplo mais visível do aumento exponencial do número de estrangeiros que passaram a viver na terra da garoa, recentemente.

A quantidade de haitianos que buscam refúgio ou uma nova oportunidade de vida nas regiões paulistanas passou de 814 em 2011 para 14579 em 2013, população que chega a ser duas vezes maior do que a de muitas cidades do interior de Minas Gerais. 

Vindos de outro sonho infeliz de cidade, são os eles, e não mais os italianos, portugueses, espanhóis, libaneses e nordestinos, os novos moradores da avenida São João que têm aprendido depressa a chamar São Paulo de realidade.

Fugidos ou expulsos de sua terra natal pelo terremoto que devastou o país em 2010, parece até que serviram de inspiração para outra música famosa de Caetano, Haiti, cuja letra e refrão refletem a dor, indignação, desrespeito e sofrimento dos negros brasileiros e que cai como uma luva em ralação à situação que os nativos de Porto Príncipe vêm enfrentando na cidade: “O Haiti é aqui. O Haiti não é aqui”.

Muitos vêm exercendo atividades técnicas e braçais na construção civil. Outros têm sobrevivido como camelôs ou se submetendo a trabalhar em média 14 horas por dia em condições semiescravas e degradantes para ganhar até um salário mínimo, embora possuam um perfil não muito diferente do perfil do brasileiro médio, segundo pesquisa realizada pela PUC-MG que apontou que a maioria tem segundo grau incompleto e faixa etária entre 25 e 34 anos.

Exploração e preconceito

Foto: Fernando Pereira/SECOM (06/05/2014) Fotos Públicas

Os irmãos Rony, 26 anos, e Roniel, 25 anos, são exemplos de imigrantes que viveram a exploração de mão de obra na cidade. Expulsos do Haiti pelo terremoto que devastou o país em 2010, onde perderam os pais e dois irmãos que nunca tiveram os corpos encontrados e identificados, eles estão no Brasil há 18 meses.

Chegaram a trabalhar 16 horas diárias como serventes de pedreiro na construção civil e depois como ajudantes de cozinha em um restaurante Self service. “Trabalhávamos em troca de comida e de um rendimento de R$ 540,00. Como tínhamos que pagar, cada um, R$ 300,00 de aluguel em um quarto de pensão, não sobrava nada”, afirmam chateados. 

Inconformados com o desrespeito, resolveram dar a volta por cima, decretaram a independência e hoje chegam a ganhar até R$ 1000,00 vendendo relógios por R$ 30,00 na região da Praça da República em São Paulo.

Sentem-se beneficiados porque os “rapas” não caem em cima deles. “Pelo fato de não sermos brasileiros, eles não tomam nossos produtos. Acho que têm medo de sofrer alguma punição do governo, da delegacia de imigração”, confessa Jacquet, aliviado, mas um tanto decepcionado com o Brasil por acreditar que iria encontrar um emprego decente com possibilidade de estabilidade financeira em um médio prazo.

As funções subalternas ou de pouca valorização profissional e as péssima condições de trabalho que são oferecidos aos imigrantes não acontece somente no Brasil. É assim também na Europa. 

Segundo o economista e sociólogo José de Almeida Amaral Júnior, o europeu também não bota a mão no trabalho mais pesado. “As antigas colônias migram para as metrópoles para buscar emprego e o emprego que vão ter não é o de professor, mas de lavador de pratos, limpador de banheiro e varredor de chão”, afirma.

Apesar de existirem leis brasileiras rígidas que proíbem a contratação ilegal e a exploração da mão obra imigrante, a fiscalização ainda deixa a desejar e muitos imigrantes acabam cedendo às exigências desrespeitosas de quem pode contratar. 

Vivem o tempo todo na corda bamba e presos a um dilema: não podem voltar aos seus países de origem porque não têm mais dinheiro e não conseguem continuar por aqui sem ter onde morar ou o que comer.

Para Amaral, no Brasil, os haitianos encontram outro problema: o preconceito. “Algumas pessoas reclamam porque eles são haitianos. Porque o cara é negro. Se fosse alemão, italiano francês ou português ou se achassem eles bonitinhos e de olho claro, não tinha erro. Se o cara é negro, haitiano ou angolano, reclama-se. Não pelo desequilíbrio do mercado ou pelo medo do desemprego, mas por preconceito mesmo, porque se o país tem pleno emprego pode absorver todos esses migrantes. ”, sentencia.

Amaral acredita que, por enquanto, a onda de imigração não tem solução, afinal o mundo está em crise e é uma crise séria. Não há perspectivas de uma melhora relativamente rápida. 

Um país ou outro ainda consegue se safar, “mas de um modo geral a economia mundial está devagar no sentido de não poder absorver de uma forma fácil a mão de obra que vem de outro lugar. “Se a economia vai bem e está funcionando, até no deserto os Tuaregs vivem”, conclui.

A exceção e a regra
Foto: Laura Daudén/Conectas.org (29/04/2014) Fotos Públicas

Mas, como toda regra tem exceção, há também quem tem sorte em meio a esse turbilhão de dúvidas e incertezas econômicas. É o caso de Jacques Card Renel, 38 anos. No Brasil há apenas seis meses e Adventista do Sétimo Dia, Renel conseguiu um emprego registrado na Igreja Batista da Liberdade.

Professor de costura e costureiro no Haiti, pai de um casal de filhos que deixou por lá e dos quais morre de saudade, mãos calejadas e olhos marejados de lágrimas, Edi, como é conhecido na igreja, sente-se abençoado e feliz, mesmo trabalhando como auxiliar de serviços gerais.

“No Brasil está difícil até para os brasileiros encontrarem emprego, mas graças a Deus e aos irmãos da igreja consegui um trabalho que me dá um salário bom e que me permite ajudar meus filhos e minha família que ficou em Porto Príncipe, confessa aliviado.

Renel, que fala fluentemente francês, inglês, espanhol, criolo, já “arranha” bem português. Diz estar satisfeito e feliz e confessa que dificilmente volta a morar no Haiti, que o seu maior sonho é conseguir uma residência e trazer a família para o Brasil.

Jacques Renel não tem sido o único abençoado. As igrejas vêm se notabilizando como o lugar onde outros muitos imigrantes têm encontrado conforto espiritual e abrigo.

Católicos e evangélicos dividem a atenção e a preferência dos povos africanos que chegam ao Brasil. É o caso Igreja Adventista do Sétimo Dia Central Paulistana e da Paróquia Nossa Senhora da Paz.

Elas já receberam mais de 10 mil imigrantes de várias nacionalidades, inclusive exilados e refugiados. Oferecem aulas de português, acompanhamento jurídico, social, psicológico, orientação profissional, acompanhamento médico e encaminhamento ao emprego. “A missão principal é o amor ao próximo e o cumprimento do “ide” de Jesus”, afirma o administrador da Liber – Igreja Batista da Liberdade – Francisco Rissato.

Habitantes do novo quilombo de Zumbi que São Paulo se tornou nos últimos anos, os imigrantes só querem é ser feliz. Suas histórias parecidas e realidades semelhantes têm marcado a vida e o dia a dia da não mais túmulo do samba e da não tanto terra da garoa.

São homens e mulheres que, apesar da dor, do banzo e da distância, têm resistido, para mostrar “aos outros quase pretos (e são todos quase pretos) a grandeza épica de um povo em formação”, que há lugar para todos na terra dos mil povos e que dá para viver um sonho feliz de cidade na Pan-America de Áfricas utópicas.

Que o sonho deles seja possível, que todos sejam bem-vindos e que a exceção - aqueles que têm se dado bem - se torne a regra.

O ABC DA IMIGRAÇÃO

IMIGRANTE: Pessoa que imigra ou imigrou, que entra em um país estrangeiro com o objetivo de residir ou trabalhar.

EMIGRANTE: Êxodo de indivíduos ou grupos, considerado do ponto de vista do país de origem. No âmbito sociológico, a emigração consiste no abandono voluntário do seu país de origem, por motivos políticos, econômicos, religiosos etc.

ASILADO: Que recebeu asilo, refúgio.

ASILADO POLÍTICO: Sob proteção ou, em determinadas circunstâncias e sob determinadas condições. É dada no território de um Estado ou de suas missões diplomáticas creditadas no exterior para pessoas perseguidas por suas opiniões políticas, crenças religiosas ou as suas condições étnicas.

EXILADO: Que foi exilado ou se exilou, banido, degredado, deportado, desterrado, expatriado, proscrito, despatriado.

REFUGIADO:  Indivíduo que se mudou para um lugar seguro, buscando proteção. Aquele que foi obrigado a sair de sua terra natal por qualquer tipo de perseguição; quem se refugiou; pessoa que busca escapar de um perigo. Refugiado político. Quem foi obrigado a deixar sua pátria por sofrer perseguição política.

TEMPORÁRIO: É quando uma pessoa vai para um lugar e depois de um tempo volta ou vai e volta depois de um longo tempo.

PERMANENTE: Quem foi autorizado a estabelecer residência fixa em outro país por trabalho permanente ou por ter estabelecido vínculos familiares com pessoas do país em que passou a viver.

COIOTE: Traficante de seres humanos ou que, mediante extorsão e pagamento de dinheiro, abusos físicos, estupro, submetem pessoas às suas vontades em troca de liberdade ou permissão para entrar ou sair de uma região.

Clique aqui e confira também a entrevista com o economista e professor José Amaral.

4 de mar. de 2016

POR UM TRIZ


Foto: Ricardo Sturkert/Instituo Lula (03/03/2016) Fotos Públicas


“A Casa caiu! ”. Foi assim que muitos brasileiros reagiram à ação da Polícia Federal contra o ex-presidente Luiz Inácio da Silva na 24ª etapa da Operação Lava Jato.

Se para alguns causou surpresa, o mandado que intimou Lula a depor e depois ser liberado já era esperado por ele e pelo PT. As últimas atitudes do ex-presidente só anteciparam o inevitável.

Ao exigir que José Eduardo Cardozo deixasse o Ministério da Justiça por não agir com pulso firme em relação à PF, Lula juntou a fome dos juízes da Lava Jato com a vontade de comer. Fritou a si mesmo. Colocou na mão dos seus carrascos a corda que pode vir a enforcá-lo.

Aliás, as últimas atitudes de Lula têm sido marcadas por uma série de erros de estratégia, o que demonstra que ele está perdido em seus próprios enredos, girando em torno do próprio eixo.

Seu discurso cheio das mesmas justificativas já está se tornando vazio e cansativo. Repetição desagradável de sons desiguais.

Ao atirar em tudo e em todos, o ex-presidente corre o risco de acabar acertando em si mesmo. Ou passa a ter estratégia própria ou continuará sendo parte da estratégia dos que querem pegá-lo.

Ao optar por continuar responsabilizando os outros pelas faltas que ele mesmo cometeu, Lula abre mão de sua sabedoria política e erra ao acreditar que no mundo político o ataque é a melhor defesa.

Se quem não deve não teme, deveria ficar tranquilo e tranquilizar os que estão ao seu redor e aqueles que, por enquanto, ainda acreditam nele.

Se continuar a bater de frente com os que querem enquadrá-lo e persistir em querer transformá-los em seu saco de pancadas, o ex-presidente corre o risco ver o feitiço virar contra o feiticeiro e de ser atingido em cheio por seus próprios socos.

Ao confiar na crença de que o bem que fez ao país ao longo dos seus dois mandatos o redimirá, Lula poderá se tornar a voz do que clama no deserto e acabar sozinho e isolado.

Não se iluda presidente, “o símbolo da ingratidão não é a serpente, é o homem”. No mais, na política, no amor e nos negócios não existe cão fiel.

2 de mar. de 2016

A ÓPERA DOS MALANDROS


Foto: Reprodução/Universaljp.org


As últimas delações premidas da Lava Jato são provas da perversidade e do mercantilismo selvagem do atual modelo de financiamento de campanhas eleitorais no Brasil.

Ao mesmo tempo que esse modelo sujo expõe a facilidade de se corromper, de aceitar ser corrompido e de estimular a falcatrua, torna também financiados e financiadores reféns dos seus quereres e das vontades do capitalismo algoz.

Os tentáculos afiados do viciado e vicioso sistema de financiamento político brasileiro não poupa ninguém, seja de esquerda de centro ou de direita.

Democratas, republicanos, liberais ou socialista, todos parecem ter o rabo preso com os esquemas avessos dos financiamentos partidários. 

Reforma política de verdade e para valer, nem pensar.

O dinheiro ilegítimo oriundo das empresas que bancam os políticos brasileiros e seus partidos fortalece o capital de tal modo que transforma homens públicos em vermes parasitas.

Não podemos, nem devemos sequer chamar as altas quantias que saem dos bolsos de empresários, empreiteiros e afins de doações, mas de empréstimos.

Investimentos que são prontamente cobrados com juros e correção monetária assim que o derrière de seus financiados assenta as suntuosas cadeiras dos palácios e das casas legislativas.

Financiar campanhas políticas há muito tempo é o negócio mais rentável do Brasil. 

Os partidos deixaram de ser agremiações políticas e tornara-se empresas com ações altamente rentáveis na bolsa de valores das disputas eleitorais.

Negócio bom para ambos os lados, as doações financeiras para campanhas eleitorais são um retrato vivo e em cores do que é o fazer política no Brasil: investimento com retorno garantido.

Foto: Reprodução
Nesse longa metragem digno de fazer inveja aos maiores chefes das máfias, os mocinhos e os bandidos se confundem de tal modo que chega a ser quase impossível saber quem é quem.

Na ditadura sabíamos quem é o inimigo, hoje o inimigo pode ser qualquer um.

Contudo ainda há entre eles quem se ache indignado com tudo que está acontecendo, como se não soubesse de nada ou desconhecesse ou nunca tivesse usado as artimanhas ardilosas do poder. Exemplo disso são alguns oposicionistas de carteirinha.

Puritanismo hipócrita, santos do pau oco! Sepulcros caiados. Por fora bela viola, por dentro…

Malandragem, dá um tempo! Chega de oportunismo barato e nojento. 

Mamar nas tetas da vaca ninguém quer.

Vossas senhorias não enganam mais ninguém, apesar da blindagem midiática da imprensa hegemônica e de vossa insistência burra em subestimar a inteligência de todos. 

Diante da realidade crua, das mentiras deslavadas e dos falsos arroubos moralistas e moralizantes dos caras de paus abonados pela justiça seletiva de alguns juízes, a dura constatação vem do filósofo popular Bezerra da Silva; “se gritar pega ladrão, não fica um, meu irmão!

A hora é de arregaçar as mangas, exigir e lutar por uma reforma política ampla, irrestrita, verdadeira e desinfetante. Já! 

Caso contrário, malandro vai continuar malandro e mané vai continuar mané.