7 de dez. de 2015

ARQUEÓLOGO DAS PALAVRAS


Foto: Reprodução
A morte de Wolney de Assis deixa o teatro e as artes outra vez órfãos de mais um grande artista


O teatro perdeu mais um dos seus grandes talentos. O ator, diretor e dramaturgo Wolney de Assis, 78 anos, se despediu da vida no domingo (06/12), em São Paulo, vítima de câncer.

Pouco conhecido do público, mas muito admirado e respeitado pela classe artística, ele foi uma referência intelectual e mestre para várias gerações de atores.

Gaúcho de Porto Alegre, desembarcou em São Paulo nos anos 50 para participar do Festival Amador de Santos e apresentar a peça Egmont, de Goethe. Sua interpretação lhe rendeu o prêmio de melhor ator e chamou a atenção do crítico de teatro Sábato Magaldi que o incentivou a continuar atuando na capital paulista.

Fixou residência em São Paulo e iniciou sua carreira profissional no Teatro Bela Vista, cujos donos eram Sérgio Cardoso e Nydia Lícia. Foi no Oficina e no Arena, entretanto, que encontrou o estilo de teatro com qual se identificava e gostava de atuar.

A partir daí, entrou em contato com o movimento político e começou a atuar também como militante da liberdade em outros fronts. Foi perseguido pela ditadura militar e ficou afastado dos palcos durante 20 anos.

Em 1961, conheceu e casou-se com a atriz Berta Zemel. Ao longo de anos, o casal dedicou-se a formar várias gerações de atores no 7Cênico – Teatro Móvel de São Paulo. 

Durante o tempo em que ele foi perseguido pelos militares, permaneceram fieis à paixão pelo teatro encenando peças pelo país a bordo de uma perua Kombi.

Em 1997, por incentivo de Berta, Wolney voltou a atuar. Dessa vez no cinema. Aceitou o convite do diretor Beto Brant e integrou o elenco do filme Os Matadores. 

O longa foi bem recebido e elogiado pela crítica internacional e Wolney mais uma vez se destacou por sua interpretação marcante. Em 2006 atuou ao lado de Selton Mello em O Cheiro do Ralo, do pernambucano Heitor Dhalia.

Ator apaixonado pelas palavras, Wolney soube valorizá-las ao máximo. 

Era um diretor que, quando os atores achavam que já tinham esgotado todas as possibilidades cênicas e interpretativas, surpreendia com um olhar e um visão que iam e estavam sempre além.

Sabia dissecar um texto como um exímio anatomista e explorava a interpretação dos atores e a palavra com competência arqueológica. Máximo Gorki, Shakespeare, Eugene O'neill, Molière, Tennesse Willians, Fiodor Dostoievski, Plínio Marcos, Fernando Arrabal, Sófocles, Martins Penna, Fernando Pessoa, são testemunhas da verticalidade e da qualidade com que investigava o humano.


Sua voz baixinha, a qual justificava dizendo que era charme, orientou muitos atores e diretores que se tornaram famosos. Amante do bom papo, passava horas conversando de tudo, sobretudo de teatro, sempre acompanhado do café e do cigarro.



Wolney foi um farol que guiou outros amantes da arte como ele. Revolucionário, contestador, provocador e iluminista ao seu modo, manteve viva e acesa a chama do teatro. 

Sua luz, seus ensinamentos e sua sabedoria vão fazer falta para todos nós, apaixonados pela arte de representar, como ele sempre foi.


Gratidão e carinho, mestre!

Meus sentimentos e solidariedade, Berta Zemel.

RIP, Wolney!

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