12 de dez. de 2016

JOGO DURO

Reforma da Previdência, Aposentados, Pensionistas, INSS
Reforma da Previdência: Pouca luz no fim do túnel
Foto: ANPR (14/06/2016) Fotos Públicas
As propostas para a reforma da Previdência finalmente foram divulgadas e enviadas ao Congresso Nacional para serem analisadas e votadas.

O rigor e a dureza das medidas que Michel Temer pretende adotar para essa e às próximas gerações em relação à aposentadoria chamaram a atenção da população e deixaram preocupados trabalhadores e aposentados nos quatro cantos do país.

Segundo o governo, a Previdência se tornou um poço sem fundo e a reforma é a solução inadiável. Porém, a crise política e o descompasso entre os três poderes também têm gerando discussões e especulações variadas em relação ao assunto e podem tumultuar a aprovação das propostas.

Diante das dúvidas e incertezas, os números falam mais alto.

Rombo de R$ 130 bilhões projetado para esse ano, quantidade de idosos crescendo maior do que a de jovens, receita menor do que a despesa, são algumas das justificativas do governo para a necessidade e urgência da reforma.

Dados do IBGE mostram que últimos 20 anos o número de aposentados dobrou e já passa dos 30 milhões, a expectativa de vida melhorou alcançando a média de 74 anos de idade, enquanto a quantidade de nascimentos vem caindo acentuadamente.

Hoje o Brasil tem cerca de 30 milhões de aposentados, o dobro de 20 anos atrás. Nos próximos 25 anos os idosos serão a metade da população brasileira. A proporção hoje é de 09 trabalhadores para 01 aposentado. Nos próximos anos essa proporção será de 04 para 01. 

Nesse cenário em que as contas não fecham a solução mais imediata parece ser a maioria perder para que todos possam ganhar.

Mas será que essa solução também é a mais justa?

Os mais jovens terem que pagar o pato, alguns direitos serem revistos e novas conquistas adiadas é mesmo inevitável?

Será que é preciso tudo isso mesmo?

O BLOG DO JOAQUIM realizou uma série de três entrevistas sobre a reforma da Previdência. Consultou um especialista a favor e outro contrário à reforma e às propostas apresentadas pelo governo Temer.

Nessa primeira entrevista vamos conhecer as opiniões de Antônio Bruno Carvalho Morales, economista favorável à reforma previdenciária e professor do Insper.

Na quarta-feira, a entrevista será com Marta Gueller, Doutora em Direito Previdenciário, contrária à reforma e às propostas apresentadas pelo governo federal.

Na sexta-feira, os dois especialistas debaterão conjuntamente o tema, analisando alguns pontos das propostas.

Reforma da Previdência, Aposentados, Pensionistas, INSS
Antônio Bruno Carvalho Morales, Economista e Professor
Foto: Reprodução


BLOG DO JOAQUIM: Antes mesmo das propostas serem divulgadas em sua totalidade, o que foi vazado na mídia gerou um clima de expectativa e uma discussão mais acalorada entre os defensores e os opositores da reforma previdenciária. O senhor é um dos economistas favoráveis à reforma. Porque ela é necessária?

Antônio Bruno Carvalho Morales: Primeiramente porque nos últimos anos a população brasileira, e mundial, de maneira geral, tem envelhecido e esse envelhecimento, devido ao aumento da expectativa de vida, faz com que menos gente no mercado de trabalho esteja bancando mais gente fora do mercado de trabalho e por mais tempo. Esse problema tem se tornado cada vez mais relevante em termos de orçamento público.

BJ: Se a reforma da Previdência demorar para acontecer, o que pode ocorrer com o Brasil nos próximos anos?

Antônio Bruno Morales: Nós já estamos com um problema de crescimento econômico, o que dificulta bastante a arrecadação. Em termos práticos, o que pode acontecer nos próximos cinco ou dez anos é nós termos cada vez menos gente bancando um contingente muito grande e elevado de pessoas aposentadas. Isso em termos de projeção pode fazer com o governo tenha que aumentar a arrecadação em torno de 10% do PIB, o que seria muito oneroso para o país.

BJ: Desde que a imprensa começou a falar mais sobre a reforma da Previdência, aumentou a procura da população aos postos do INSS para dar entrada nos pedidos de aposentadoria. Até que ponto o temor do brasileiro, e essa procura quase que desesperada da população, fazem sentindo?

Antônio Bruno Morales: O que mais chama atenção é a incerteza quanto a mudança de regimento. As pessoas têm muita dúvida se a idade mínima vai subir. E de fato isso é uma tendência mundial. Países como França têm aumentando a idade mínima para o cidadão se aposentar, de modo que, diante de tantas incertezas internas, as pessoas que já vinham planejando sua aposentadoria ficam mesmo inseguras.

BJ: O aumento da idade mínima é um problema de que natureza?

Antônio Bruno Morales: Isso é basicamente um problema de economia política. Eventualmente uma população para fazer a transição para um regime previdenciário mais saudável, do ponto de vista de contas do governo, vai ter que pagar um pouco mais. O maior medo é que seja a geração de hoje. Quem tem buscado os postos do INSS tem feito isso exatamente porque não quer ser o primeiro a sofrer eventuais baixas em termos de benefícios, por exemplo.

BJ: A reforma da Previdência envolve questões econômicas e políticas, mas também envolve interesses distintos. De que forma esses fatores têm inviabilizado ou atrasado a realização da reforma?

Antônio Bruno Morales: Tem atrasado bastante porque é um tema que em termos políticos ninguém quer colher, nem ter esse custo para si. Nenhum político, por mais que se diga na mídia que precisamos fazer a reforma seja assim ou assado, quer em termos práticos assumir que foi ele quem fez ou ajudou a fazer a reforma previdenciária.

BJ: O que de mais há além disso?

Antônio Bruno Morales: No mais, há um conflito de gerações. Alguma geração vai ter que ser penalizada, seja essa ou a próxima. Nenhum político quer tomar esse ônus para si. Talvez por isso o presidente Temer tem entrando mais firmemente na discussão, dado que ele não foi eleito presidente, ele foi eleito vice-presidente. Por isso ele pode tratar o assunto de maneira mais contundente já que, o fato dele não ter sido eleito, dilui um pouco seu custo político. 

BJ: Até que ponto o fato do Congresso não querer arcar com o ônus e a atual situação política do país podem inviabilizar a aprovação da reforma previdenciária?

Antônio Bruno Morales: Vai depender muito de como a Câmara e o Senado irão se organizar. Depende muito do contexto político. De qualquer forma, as partes que são mais interessadas são as que sofrem mais. Existe um conflito em economia política que diz que as pessoas que vão atrás são as pessoas que estão sofrendo, no caso da reforma é quem está para se aposentar. Por outro lado, as pessoas que seriam as mais beneficiadas no longo prazo, no caso os jovens e até a população como um todo não se mobilizam. Às vezes por desconhecer benefícios que a reforma pode provocar no curto prazo, como por exemplo a queda dos juros.

BJ: Considerando o Congresso Nacional que temos hoje e as propostas que já foram aprovadas e recusadas por ele nesse governo e no anterior, qual a disponibilidade dos congressistas em aprovar ou recusar as propostas da reforma da Previdência?

Antônio Bruno Morales: Acredito que é um ponto difícil e que, com certeza, vai gerar diversos conflitos. Temos que abrir mais o debate de forma mais consistente, tentando mobilizar mais a opinião pública a ter mais acesso ao Congresso e exercer mais pressão.

BJ: Analisando a história de nossa Previdência Social ao longo dos anos, quais são os pontos positivos e os pontos negativos de nosso sistema previdenciário da forma que ele está estruturado atualmente?

Antônio Bruno Morales: Em ternos de sistema, o principal problema é que o contribuinte de hoje paga para o aposentado de hoje, ou seja, é um sistema em que você beneficia quem já está aposentado. O ideal, ou menos oneroso em termos de governo, seria um sistema de capitalização, em que o Estado capta o dinheiro contribuído, via algum título público ou alguma forma de remuneração, e quando o cidadão for se aposentar recebe de volta o dinheiro que ele pagou ou contribuiu. Em termos práticos isso é mais oneroso de se fazer, principalmente porque há um conflito de gerações, como eu já expliquei anteriormente.

BJ: Até que ponto a aposentadoria complementar, uma opção à aposentadoria tradicional, é uma possibilidade positiva, sem esquecermos de considerar a realidade econômica do país e a desigualdade social que ainda é alta no Brasil?

Antônio Bruno Morales: O ponto principal é incentivar as pessoas a pouparem desde cedo. Sempre faço uma analogia como a pessoa que faz regime. A pessoa acorda disposta a começar o regime na segunda-feira, só que, por um acaso, está chovendo e ele resolve não sair e fica na cama. A mesma coisa acontece com as decisões de poupança. Acha-se que se é jovem ainda e que não se precisa poupar agora. O caminho é fazer de forma sistemática as pessoas reagirem a esse incentivo e ajudarem um pouco mais o Estado tomando a decisão de poupar. Em termos práticos, é estimular as pessoas a fazerem a auto aposentadoria.

Reforma da Previdência, Aposentados, Pensionistas, INSS
Pospostas para reformar a Previdência provocam dúvidas e geram incertezas
Foto: ANPR (14/06/2016) Fotos Públicas


BJ: No que diz respeito à reforma previdenciária, o incentivo à aposentadoria complementar não diminui a responsabilidade do governo em relação à Previdência, passando para a iniciativa privada o ganho real e garantido que seria do Estado?

Antônio Bruno Morales: De certa maneira sim. Mas, por outro ponto, a curto prazo, a responsabilidade maior do governo, em termos de soluções, é subir a idade para se aposentar ou desatrelar a aposentadoria do reajuste do salário mínimo, questões que tem que ser discutidas profundamente.

BJ: A aposentadoria complementar na faz parte da cultura de nossas gerações. Qual a possibilidade da Previdência Privada se tornar um hábito para as gerações que vão ter que conviver com um novo regime previdenciário, caso a reforma seja realmente aprovada? Qual a disponibilidade que essas gerações vão ter em investir em uma aposentadoria complementar?

Antônio Bruno Morales: Depende muito de como nós geramos os incentivos paras as pessoas. Os seres humanos, de uma maneira geral, reagem aos incentivos, sejam eles positivos ou negativos. Por alguma razão, especifica ou cultural, por exemplo, o Japão poupa mais do que o Brasil. No nosso caso, acredito que a responsabilidade do governo é criar na população a conscientização de que seria produtivo para o país como um todo que as pessoas poupassem um pouco mais, tanto no sentido do curto prazo, para gerar mais investimento, quanto no sentido da Previdência.

BJ: Temos como fazer uma reforma previdenciária definitiva ou daqui há alguns anos vamos ter que fazer a reforma da reforma?

Antônio Bruno Morales: Aparentemente e infelizmente não existe uma reforma definitiva. Se analisarmos diversos países que enfrentam esse mesmo problema, eventualmente, em dez anos, as condições demográficas mudaram e ele tiveram que lidar com outros problemas. O ponto principal é que já temos um horizonte de 20 ou 30 anos em que sabemos que a população vai envelhecer e nossa base em ternos de população economicamente ativa vai diminuir, no sentido que teremos proporcionalmente menos gente bancando as pessoas aposentadas.

BJ: Em ternos práticos, o que é mais importante agora?

Antônio Bruno Morales: Qualitativamente falando, o pulo que temos que dar é como encarar esse fato que vai acontecer. Isso é o principal agora. Em termos de reforma definitiva acredito que não há. Daqui a 40, 50 anos vamos ter outro tipo de comportamento demográfico. Podemos, através de análises estatísticas, prevê um pouco desse comportamento, mas não sabemos o que realmente vai acontecer e, eventualmente, teremos que nos adaptar a isso.

BJ: Quais são os fatores externos ou não inerentes à situação da Previdência Social que podem atrapalhar a reforma e impedir que ela aconteça de forma efetiva?

Antônio Bruno Morales: Primeiramente o aspecto político. Não vivemos um momento politicamente tranquilo, afinal acabamos de sofrer um processo de impeachment da presidente Dilma. Além disso, a questão da ação coletiva, ou seja, a mobilização de pessoas que em geral seriam melhores beneficiadas. São questões comuns na literatura de economia. Tem um pouco desses dois problemas, mas, no curto prazo, vejo a questão política como uma dificuldade extra, além do baixo crescimento econômico que não vai se resolver em um estalar de dedos. Temos projeções muito ruins para o final desse ano e para 2017. Algo em torno de -3,6% e -3,8% de crescimento. Isso claramente nos atrapalha em ternos de planos para reforma da Previdência.

BJ: Alguém vai ter que pagar pelo ônus da reforma. Quem vai pagá-lo?

Antônio Bruno Morales: Provavelmente, em termos políticos, será o Poder Executivo, no caso o presidente Michel Temer. Acredito que ele parece estar disposto a isso. Porém, especificamente, no que diz respeito à transição de sistemas entre reformas, acho que é a geração que se está para aposentar. Talvez, por isso, as pessoas estejam correndo aos postos do INSS para dar entrada no processo de efetivação de aposentadoria. 


Local: SÃO PAULO São Paulo, SP, Brasil

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